O Serviço Nacional de Investigação Criminal (SERNIC) ouviu nesta quarta-feira (17) representantes do Centro para Democracia e Direitos Humanos (CDD) no âmbito das investigações sobre o duplo assassinato do advogado Elvino Dias e do activista político Paulo Guambe, ocorrido a 18 de outubro de 2024. A audição visou recolher informações adicionais apresentadas pela ONG, que tem se posicionado como denunciante do caso.
Segundo o Diretor-Geral do CDD, Adriano Nuvunga, a organização reiterou às autoridades a necessidade de responsabilizar todas as figuras envolvidas, direta ou indiretamente, no contexto do homicídio. Entre os nomes apontados, estão deputados da Assembleia da República que, na véspera dos assassinatos, partilharam mensagens suspeitas nas redes sociais. Para Nuvunga, essas mensagens devem ser tratadas como indícios relevantes no processo criminal.
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Durante sua declaração aos jornalistas, Nuvunga foi ainda mais longe, defendendo que o antigo Presidente da República, Filipe Jacinto Nyusi, também seja ouvido no processo. Ele mencionou o discurso do ex-chefe de Estado, que, dias antes do crime, afirmou que havia "barulho" na sociedade que precisava ser silenciado com outro "barulho". “Essas palavras não podem ser ignoradas. A investigação deve ser abrangente, e todos que fizeram pronunciamentos que podem ser interpretados como ordens disfarçadas devem ser considerados”, frisou o activista.
Investigação marcada por denúncias e morosidade
À época dos crimes, o advogado Elvino Dias trabalhava em processos relacionados à alegada fraude nas eleições presidenciais de 9 de outubro, em que se atribuía a vitória a Venâncio Mondlane. Em janeiro, o CDD apresentou uma denúncia à Procuradoria-Geral da República (PGR), identificando como suspeitos dois reclusos da Cadeia Civil de Maputo, que teriam sido retirados do estabelecimento prisional sob ordens do Chefe do Departamento de Operações Penitenciárias, sob o pretexto de irem a uma machamba.
Nos meses seguintes, a ONG reforçou as denúncias com novos elementos de prova e, em junho, exigiu da PGR uma ação urgente para impedir a destruição de evidências no interior da cadeia. Apesar disso, segundo Nuvunga, há uma perceção de intimidação a pessoas que forneceram informações essenciais à investigação.
Apesar da lentidão do processo, o CDD considera que o SERNIC demonstra algum nível de empenho, embora haja dúvidas quanto à vontade política de avançar com as acusações. “Pode ser que, ao mais alto nível, falte essa vontade. Mas nós, sociedade civil, continuaremos a pressionar diariamente para que se faça justiça”, disse Nuvunga.
Expectativas para o processo
A ONG espera que, ainda neste semestre, o processo seja formalmente encaminhado ao Ministério Público, com posterior submissão ao tribunal. “Os elementos estão ali. Só que, a nível mais alto, parece que há pessoas que não querem que o processo ande”, finalizou.
O caso continua a atrair atenção nacional e internacional, sendo considerado um teste à independência e integridade das instituições judiciais moçambicanas.