Beira, Sofala – 3 de Setembro de 2025 – O Governo de Moçambique concluiu uma estratégia nacional que visa expandir significativamente a rede de áreas marinhas protegidas, elevando a cobertura atual para entre 10% a 12% do território marítimo nacional. O documento, que se encontra em fase de consultas interministeriais antes de ser submetido à aprovação do Conselho de Ministros, foi apresentado esta quarta-feira durante a 3.ª Conferência da Biodiversidade Marinha, realizada na cidade da Beira, província de Sofala.
A “Estratégia Nacional e Plano de Acção para a Expansão da Rede das Áreas de Conservação Marinhas (ACM)” surge após um diagnóstico de 2020 que identificou lacunas na proteção da biodiversidade marinha do país. O plano estabelece um roteiro para que Moçambique cumpra as metas internacionais definidas nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável e na Convenção sobre Diversidade Biológica.
Comunidades locais ganham protagonismo na conservação marinha
Um dos elementos mais inovadores da estratégia é o reconhecimento formal das Áreas de Gestão Comunitária (OECM – Other Effective Area-Based Conservation Measures). Pela primeira vez, o país propõe contabilizar para as metas nacionais de conservação as áreas marinhas geridas por comunidades locais, mesmo que não tenham o estatuto formal de área protegida.
Emílio André, diretor de divisão do Instituto Oceanográfico de Moçambique, explicou que “esta abordagem baseia-se nas diretrizes da Convenção sobre Diversidade Biológica, que prevê o reconhecimento de contribuições positivas para a conservação mesmo fora do sistema tradicional de áreas protegidas”. O mapeamento preliminar identificou 128 unidades de gestão comunitária ao longo da costa, das quais 49 têm condições para certificação imediata como OECM.
Desafios operacionais e sustentabilidade financeira
Especialistas alertaram para os desafios de implementação da estratégia, sobretudo em termos operacionais e financeiros. Mohamed Harun, assessor sénior da Autoridade Nacional de Áreas de Conservação, destacou que “a expansão quantitativa não pode comprometer a eficácia da gestão das áreas já existentes”.
Segundo os dados apresentados, muitas das áreas marinhas protegidas atuais enfrentam dificuldades de gestão, com níveis de efetividade considerados insatisfatórios. O especialista enfatizou que declarar novas áreas sem os recursos necessários pode gerar consequências negativas a longo prazo.
A estratégia prevê quatro pilares para implementação: reforma das políticas de conservação, criação e gestão de novas áreas, investigação científica aplicada e mecanismos de financiamento sustentável. O financiamento é considerado crítico, já que o subfinanciamento crônico limita a eficácia das áreas protegidas existentes.
Reforma da pesca artesanal e gestão comunitária
Rui Motumbene, da Autoridade para o Desenvolvimento Nacional das Pescas, explicou como a estratégia se conecta com a reforma do setor, criando Áreas de Pesca de Gestão Comunitária (APGC). “Estas áreas não apenas conservam, mas organizam a pesca de forma sustentável, garantindo recursos e meios de subsistência às comunidades costeiras”, afirmou.
O modelo inclui zonas de recuperação de recursos, vedas temporárias, exclusão de artes de pesca destrutivas e regulamentação do esforço pesqueiro. A gestão comunitária representa um avanço em relação ao modelo tradicional, integrando conhecimento local e promovendo participação efetiva das comunidades.
Coordenação interinstitucional é fundamental
A implementação exigirá coordenação entre diversas instituições, incluindo o Instituto Oceanográfico, ANAC, ADNAP e o Ministério dos Recursos Minerais. Luisa Rocha, diretora nacional de Geologia e Minas, destacou a necessidade de “modelos de gestão que compatibilizem a conservação marinha com a exploração sustentável de recursos minerais offshore.”
Com esta estratégia, Moçambique avança para consolidar a conservação marinha e promover um modelo sustentável que integra ciência, comunidades locais e políticas públicas, abrindo caminho para alcançar metas internacionais e fortalecer a biodiversidade marinha do país.
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